terça-feira, 25 de setembro de 2007

A ficha finalmente caiu...

Leia abaixo artigo escrito por Ruy Fabiano, do Jornal da Comunidade desta semana. Bastante esclarecedor.


"A Baixada Fluminense de Brasília"

"O Rio de Janeiro tornou-se capital do Brasil em 1763, ainda no tempo da Colônia. Deixou de sê-lo em 1960, com a inauguração de Brasília. Nesses 197 anos em que pontificou, formou em torno de si um cinturão de pobreza e violência – a Baixada Fluminense -, constituído por migrantes e excluídos sociais, cujo destino é gravitar em torno do poder, na expectativa das migalhas do banquete oficial.

Brasília tem apenas 47 anos – e já reproduz o cinturão de pobreza da antiga capital. Conseguiu estabelecê-lo numa velocidade quatro vezes maior. A Baixada Brasiliense – apelido que o presidente da OAB, Cezar Britto, deu ao Entorno da capital – exibe hoje todos os ingredientes que o Rio de Janeiro permitiu que se estabelecesse em sua periferia, em quase dois séculos de negligência social.

Quando o Rio despertou para o quadro de abandono social que o cercava, já era tarde. Os morros da cidade, folclorizados em numerosos sambas, como redutos de poesia e resignação, já se haviam transformado em fortalezas do narcotráfico.

E a Baixada, com suas cidades-dormitórios, carentes de infra-estrutura e ações mínimas do Estado, reproduzia em topografia plana as mesmas anomalias sociais das favelas cariocas.

A configuração presente, em que o narcotráfico ocupa morros e periferia e faz de seus moradores (em sua imensa maioria trabalhadores honestos) cinturão de proteção contra a polícia, estabeleceu-se a partir do primeiro governo Brizola, em 1982.

Embora devotado ideologicamente às causas populares, o “socialismo moreno” de Brizola tratou-as com superficialidade e visão marqueteira, com iniciativas tais como a de colocar elevadores em favelas e afirmar que, “em meu governo, polícia não sobe o morro”.

Diante disso, os traficantes subiram e estão lá até hoje, sem que nenhum governante, desde então (incluindo o próprio Brizola, que voltaria ao governo em 1990), saiba o que fazer para removê-los sem provocar um genocídio. Esse o fruto de políticas populistas ditas de esquerda, na paisagem social da ex-cidade maravilhosa.

Já em Brasília, os estragos, de dimensões equivalentes, resultam de políticas populistas ditas de direita (até hoje não descobri o que as diferencia). Joaquim Roriz, político goiano, foi nomeado governador de Brasília pelo então presidente Sarney, nos anos 80 – mesma época em que o brizolismo dava seus passos iniciais no Rio.

Roriz chegou com ânimo de permanência. E trabalhou nesse sentido, sendo vitorioso nas primeiras eleições para governador da capital federal, em 1990. Mas, como não havia reeleição, purgou breve ausência antes de retornar, em 1998 e em 2002.

Faz menos de dez anos, mas os efeitos da política populista que a partir de então adotou parecem resultar de décadas de incúria gerencial. A distribuição gratuita e maciça de lotes no entorno da cidade, sem a contrapartida de serviços de infra-estrutura e de oportunidades de emprego para os beneficiados, gerou, com uma rapidez estonteante, o quadro presente de pobreza e violência na periferia federal. Politicamente, rendeu-lhe preciosos dividendos: os beneficiários dos lotes tornaram-se eleitores cativos.

Os lotes eram o seu “bolsa-família”. Pouco lhe importavam as críticas da classe média, da imprensa ou da oposição. Eram as “elites”, dizia ele, incomodadas com a atenção que dava ao povo, etc. e tal e blá-bla-blá (qualquer semelhança não é mera coincidência).

No mapa da criminalidade, elaborado periodicamente pelo Ministério da Justiça, Brasília e seu entorno passaram a figurar, desde então, entre as cidades mais violentas do país.
O repórter Amaury Jr., do Correio Braziliense, viu isso de perto. Estava empenhado em radiografar esse ambiente, numa série de reportagens, quando, na quarta-feira (19), foi baleado a mando de traficantes. Sobreviveu, mas o trauma da agressão não é só dele ou da imprensa. É de todo o país, que constata que sua capital, até então tida como ilha da fantasia, distante da realidade sofrida dos demais entes da federação, tornou-se sua síntese mais dramática.

Brasília está cada vez mais próxima do Brasil - e cada vez mais parecida com ele: pobre, violenta e cética quanto ao futuro. Enquanto isso, o Senado discute se deve ser secreta ou não votação para julgar quebra de decoro parlamentar. Decoro? O que é isso?"

Um comentário:

Mari disse...

Falta fazer alguma coisa. Aqui e lá ;(